segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Boca do canal do mar


Alvaro Nassaralla (07/07/15)



Tudo em paz no poente acinzentado da boca do canal do mar.
O sol pediu trégua
e parou de apostar nos números dos diasa começar pelo setembro,
promíscuo,
com dias sem palavra alguma a cumprir,
em que meus xingamentos ultrapassaram a simples perjúria
de mães e orgias,
das noites sem pele.


Livre de novo, arremeto em pura paz,
letargias a que nem sempre estamos capazes
e que agora apeteço-me
no vento afogado de umidade bruta.


Esmolando como aleijado de guerra,
o inverno vai canhoto
e se sente ludibriado
com as raízes tontas e fortes que querem:
a castidade foi um dia presente da primavera.


Tudo em paz na boca do canal do mar.

Volto com a cinzalhada que cabe
nos nervos organizados da maré,
na certeza caçapa como quando tudo está 
no seu lugar
e nas primeiras esperanças
habitantes do mel, dos veios e dos milagres.


A umidade das brisas espanca na boca do canal.
Estão chegando as marias-sem-vergonha nos canteiros finos e nos acostamentos
como uma máquina de crias vegetais
que trazem polens e germens da ventania,
onde a paz sufoca-se
e pode-se até sentir piedade.
Mas a única certeza continua:
os ciclos se sucedem,
e quem fica estanque como uma estação engolida,
subestima as rótulas e o carrossel
da eternidade.


O que há mesmo de tão mal em falar das direções que não levam a nenhum tesouro?

Comigo, o silêncio aveludado do limo.
Tudo em paz na boca do canal do mar.

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