quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

CÉU CINZA (ou Como os Loucos Amam)

A. Nassaralla
(10/dez/15)

À Inajara


Encrespa-se o mar dotado chumbo
lambendo a superfície da carcaça do dia absolvido na dor
de ser quem se busca em lascas de amor remendado,
ao amor inteiro de quem encontra;
bromélias açucaradas por pavor de dar-se à embriaguez,
que assim aparvalhado é quem ama,
como o é imperdoável quem acompanha o desamor e o sem fim das horas,
o tiquetaquear dos ponteiros trançando-se pernas,
tropeçando a moda de trilhos vergados e elegidos de desvios.

De volta aos amantes,
são nuas as estrelas por cima do céu cinza
como o são as paixões e a delícia da chuva e das trovoadas livres:
agarrar-me a ti como a um último istmo,
última membrana de enseada,
último casquilho de terra,
última lasca de boca à deriva
para um mar que puxa e quer à perdição.

Serão os tons da história
os mesmos para todos os que amaram,
não importa a era,
não importa o sangue,
não importa nada?

O perdão forma o caminho das estrelas
resistentes na madrugada estrebuchante
diante dos que desafiaram o poder dos homens
em nome do amor,
em lume das estrelas cadentes,
acreditando que a vida é o complemento da morte,
e o sonho, a sanidade tecida
e roubada.

Nesses dias de inesperado frescor
eis que dou de cara com a solidão mais legítima
e hoje na vida tenho uma coleção delas,
em partições de almoxarife,
vendo ainda mais 
a noite corrompida de estrelas
e a mancha láctea
a vestir-se com leve seda translúcida 
de mínimo franzido
na sua sutil
ora maior ora diminuta
transparência
contra o fundo do céu.

É nesse sentido tenebroso
que passam agora a perder esses mesmos sentidos.
Estou seduzido num cavalo à disparada de montaria
e com os punhos cerrados batendo-se ao ar,
busco as margens para ver que há o meu amor,
que ela me espera com olhos calmos
e que o mais precioso a se ter
são seus olhos a me fitar
e que, carnívoro, entro na tempestade furtiva e louca
dos perdidos,
lanço-me à rapinagem com as aves mergulhando 
despenhadeiros da miséria humana,
e finalmente - graças,
quedo à força das coxas delicadas 
e do que ela, mulher amada, já sabe para mim,
quando o dela amor fere a turbulência
sangra com luz turquesa os mananciais loucos da ventania
do meu ser,
livra-me novamente de mim.
Desenterra e sagra o meu amor. Tinto.

Acho que o paraíso é isso.

domingo, 29 de novembro de 2015

Lampejos - Hani Hazime


 
LAMPEJOS
(Hani Hazime)

- Coitado o homem, gente de bem
Ele pensa que preenche a mulher
Ao contrário do que ela quer: um só refém,
Ou um tapa-buraco, de seu prazer
- Por todos, é escolhido o homem, pela mulher
mas o homem, escolhe todas, por uma sequer
- Entre CPI e medidas legislativas
Mescla-se tudo, para fazer pizzas
- O patriota idiota, o nacionalista ufano
com voz alta grita:
O país é meu patrimônio
- Quando a morte me tenta, em seu negrume
Embora morrendo, continuo sendo, Hani Hazime
- Porque as flores, não chegaram a tempo
Nosso amor, virou simplesmente, um contratempo
- Liberta já, o teu cabelo
E me concede, um momento de anelo
- Ergue a lona do teu corpo
Sou acrobata que sempre salta a tempo
- Ela procura, o elixir da vida, na calada
E ele quer, o regalo no embalo, e a balada
- Os votos eternos, são selados nos lábios,
Pelos beijos, bem ternos
- A beleza dura pouco, não resiste ao tempo, tampouco
O amor é forte, só acaba, com a morte
- A lágrima da mariposa
Pairou na noitada, e decaiu na alvorada
Bem na palma da rosa.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Cais Baldio: De olho no que ninguém quer ficar

Foto: Blog Tardes Poemas

CAIS BALDIO
(Alvaro Nassaralla - 17/Nov/15)






"Você adora as folhas que caem
no lago escuro
este é o banquete do poeta
sempre
querendo
penetrar
no caroço
da verdade".

ROBERTO PIVA




Cais baldio
vida maruja
sentença sem importância.
Fluxo e refluxo
como se somente o orgasmo de cartas marcadas,
as manchetes manchadas de vícios
e as premissas promíscuas de nome vida
pudessem afugentar crianças mandonas
e elizabeths rainhas de tronos e edredons piratas.

Assim sendo, anuncio o desleixo dos poetas
aqueles que conversam a prosa do estivador, do mecânico,
dos baixios e das alcovas,
e descem aperto à chave 13 de boca e estria na prosopopeia
oficial das faxinas empurronas de caixas e sujeira
para o fundo das oficinas.

Ter-se e dar-se é o comum tornado magnífico
ao garimpar ferros-velhos
como também em busca de sentidos
e desenhos de palavras,
para surfar na descoberta de latarias
onde recortes de maçarico fazem as vezes da junção
e placas moldadas em poliuretano podem fechar a boca
e esperar contextos
mas os consertos e carregamentos não esperam,
e já estão em outra
a cada nova unção da noite que se prepara à deitar,
sendo novas rotinas as únicas que dispensam o novo!?

Então estarão muitos cagando regras de como se relacionar
numa ode direta e simples de raiva,
um prontuário de recalques e entradas sociais permitidas:
_ Os incomodados que se retirem ou
os incomodantes que se redimam?
Pergunta-se:
quem veio para incomodar, inconformar, descondicionar,
destrancafiar,
senão o poeta, os proscritos e profetas,
como Jesus
pregando contra a usura de seu próprio povo,
e as meninas da vida de lida dura
exigindo seus direitos trabalhistas?

Estarão as mocinhas de família fadadas a descobrir
que seus reinos inundam-se de chavões em primeira
instância fantasiosos,
carregados de prerrogativas fru-frus
fechados em dinastias temperamentais
de terem direitos naturais e herdados
preconcebidos diante de suas próprias intolerâncias
de familinha, familhão?

Se assim for, alguém tem de fazer o serviço sujo
de ficar chutando o ar no cais baldio,
mãos nos bolsos,
de olho no que ninguém quer ficar,
falando mentiras que são verdades bem contadas
e/ou não a verdade dos sacos de cereais deitados ao chão
pelos carregadores nos terminais de redistribuição
para o consumidor final.
Estará a verdade apenas nesses sacos
e tudo o que predisponho não passa
de solidão alimentada?
E se caso essa última sim for a verdade,
onde fica a fome em pleno século de
rede e globalização,
em plena era de tudo a um clique de distância?

Acaso essa for uma boa pergunta, afinal
caberia a resposta na pirataria engravatada,
transnacionalizada,
acionista e latimonetária?
Essa tal de minoria 1% do mundo?

Como num blues seco e doído de Freddie King
sunchine sunchine is all all you see now
do fundo da alma
but it all like cloud to me
tudo pode ficar azul num átimo
ótimo de solilóquio naveguidão
que vamos inacabados por aí,
retardatários das alegrias.
É Freddie, bate doído o lanho das cordas secas de sua guitarra,
sunchine is all you see now,
continuaremos essa cabotinagem de poetas vira-latas
atravessando rios e comendo piranhas
que
ao mesmo tempo
nos devoram
que isso sim
é tragar a fumaça da manhã chuvosa
do céu de quem caminha em periferias despatriadas
corda bamba da filosofia de botequim,
a melhor e a mais real delas.

Mas a realidade é bem maior e foi feita para ser falsificada
porque basta acreditar que as guerras são geradas para o lucro
guerras embaladas prontas para entrega
que de novo tudo começa
com crianças crescendo nas brincadeiras de praça
a roda do mundo girando sem parar
e ouve-se o som festivo delas brincando,
mães próximas
com sua missão única de enredarem-se para suas crias:
jamais entenderei um tempo onde mortes de guerra são faturas
e os negócios vão muito bem, sim senhor.

Com o serviço e as mãos sujas,
restou para nós
remoer o cais baldio, chutar o ar,
roer os ossos do pensamento
sem remissão
e sem aceitar essa realidade contrabandeada.

Você aceita o convite do cais baldio?

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

FILHAS (OS) DE PORRA NENHUMA ( Edu Planchêz )

Novo poema do poeta-amigo EDU PLANCHÊZ!

Nossa! Nunca veio tão a calhar, em tempos do massacre de cobertura que a mídia fez para os atentados terroristas em Paris, sendo que na véspera houve outro atentado praticado pelo ISIS em Beirute (Líbano) com 40 mortos, sem falar no da Nigéria com mais de mil mortos na mesma semana ... Esses passam batido pela mídia. O sensacional só acontece quando é no primeiro mundo ou em cidades de nível globalizado do terceiro mundo ...

O último verso desse poema diz por si só:


"E foda-se essa civilização eunuca
gestada pela gosma televisiva;
que todos se dopem com essas palavras
arrombadas filhas de porra nenhuma
"



Segue o poema completo do Planchêz para deleite de quem está de verdade no mundo!

FILHAS (OS) DE PORRA NENHUMA ( edu planchêz )
Apago todas as minhas palavras com palavras,
já que não paro de falar,
que a tagarelice se opõe ao meu silenciar,
e é entre as palavras que encontro silêncio,
que abro um novo portal,
estou a empurrar a emperrada porta da existência,
The Doors 1967 rasgando os nenhum motivos
para manter vivo em mim o último passado
de paixões complexas,
Jim Morrison grita, eu grito,
grita Diego El Khouri e Alvaro Nassaralla,
grita Tiça Matta, grita Catarina Crystal,
grita Rosa Maria Kapila
e todos os outros filhos da argila

Nascidos no barro, na borra,
na mancha alucinada William Burroughs,
nascidos e morridos,
em decomposição composição cósmica humana

Viemos da fumaça da mais deliciosa maconha,
agarrados no rabicho, no filete da lâmpada,
ou mesmo das catapultas das paredes
do cérebro metáfora Renato Russo...
e o Doors segue solto
pelas flanelas orientais
que nos acaricia
o sexo e os ouvidos

Mas voltando a tagarelice,
e o silêncio estrondo ejaculado por ela,
voltando ao pináculo da alta floresta do darma
de nada fazer sentados nus no muro das herdades

Pelos meandros dos esmiuçados olhos
que nos unem ao porrete, a porra,
ao dramático e arrombante rock sem pai nem mãe

E foda-se essa civilização eunuca
gestada pela gosma televisiva;
que todos se dopem com essas palavras
arrombadas filhas de porra nenhuma

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Sarau Corujão da Poesia - 10 anos de resistência poética no coração do Leblon





Esse mês, o sarau poético Corujão da Poesia - Universo da Leitura comemora dez anos de vida. Realizado religiosamente às terças-feiras, excetuando-se os feriados, o Corujão é organizado pelo professor João Luiz de Souza (mais conhecido como João do Corujão) e tem apoio da Universo (Universidade Salgado de Oliveira).

O sarau é apadrinhado por ninguém menos que Jorge Ben Jor. Volta e meia o "mestre", como nós o chamamos, dá as caras por lá e assume o comando do microfone.

O mestre Ben Jor e as pessoas que receberam os livros sorteados do dia.  (Foto: Vitor Vogel)

Muito consciente da importância de realizar um Sarau semanalmente e, também, como uma ponta de lança avançada no coração do Leblon, João do Corujão é o primeiro a levantar a bandeira da poesia:

"São 10 anos de OCUPAÇÃO POÉTICA e de ARRECADAÇÃO/LIBERTAÇÃO DOS LIVROS, num bairro onde MUITOS diziam: "no Leblon, tudo é moda, tudo é passageiro", só que esqueceram que no LEBLON, BELÉM, CAPÃO REDONDO, RECÔNCAVO BAHIANO ou quaisquer outros locais, "o ser humano tem fome de POESIA", tal como os filósofos e psicanalistas sempre nos disseram. Um abraço irmão em CorujaodaPoesia Universo da Leitura".



Poeta recita ao microfone (Foto: Vitor Vogel)

A missão completa-se não apenas levando a mensagem da leitura e sorteio de livros através do sarau, mas também arrecadando doações de livros que são repassados para escolas públicas, casas de detenção, asilos, etc. Vou ver quantos livros foram arrecadados e doados nesses dez anos, mas o próprio João Luiz dá uma ideia nesse trecho postado no Facebook:

"O que podemos dizer quando ganhamos MIL LIVROS no DIA NACIONAL DO LIVRO para serem LIBERTADOS em mãos de CRIANÇAS que não podem comprá-los? Gratidão Instituto Maia Vinagre! Gratidão Professor Marcelo Mocarzel e Equipe! Os livros arrecadados farão a diferença nas vidas de MUITAS CRIANÇAS!!!"



João do Corujão 'mandando' seus antenadíssimos recados (Foto: Vitor Vogel)


O Corujão é realizado todas as terças-feiras, de 21:00 h a 0:00 h na Livraria Saraiva (Avenida Ataulfo de Paiva, 1231 - Leblon, Rio de Janeiro ).

Encerrando, como o próprio Professor João Luiz diz, "No corujão tem microfone aberto, música, poesia, leitura, performance, libertação dos livros e abraços garantidos".

sábado, 24 de outubro de 2015

Cura

 
 
 
CURA
 
Alvaro Nassaralla 
20/out/15
 
A noite já deitou lar e a baía,
doce crespo contraluz enquanto flutua
sua cor de petróleo,
deixa saber do vento laço lambendo-me os braços.

Pego das vísceras das flores
e arranco um naco de qualquer coisa
onde os gatos cheiram em silêncio
o perfume
e aprendo
e quanto
o hoje está repleto de distrações
e números que nada dizem além do que
querem que digam as megacorporações.

Vou consertar o céu absoluto
como devoto das palavras estragadas,
e buscar nos desfiladeiros e na gargantas
o pó da alma e das estrelas candeeiras
para o desarvoro da cura:
tudo o que nos ensinaram ou ensinarão
ainda está errado ou é pouco
para quem quer ter um grande coração

Isca ao mar,
o molinete lança e puxa o lençol óleo negro,
franzido e transitivo das águas,
e numa coleção de vadiagens
as estrelas se encontram no entroncamento do tempo
que é o agora
o estar diante do impossível
quando o possível significa o mais improvável de tudo:
a vida.

Se a solidão é o vazio inteiro,
quero abraçar ventos impiedosos e livres de toda a dor,
deixando para trás apenas as marcas do ferimento seco:
a solidão também pode ser caminho do predestinado.

Agarro a cura e atracamos de socos
como se a poeira fizesse diferença
para estarmos assediados de paz,
e não vão ser as estrelas romeiras
acometidas de destinos,
as que trarão alguma resposta certa
a quem busca o que não ainda existe no mundo.

Trato de assinar contrato, isso sim,
de que um dia encontrarei a baía apaziguada
como mulher prostrada após o gozo
e sem perdões 
laçar a cura de frente.



quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Uma Palavrinha Sobre os Escrevinhadores de Poemas Rápidos e Modernos


Bukowski provavelmente em um quarto de pensão
dentre os di
versos em que morou durante a vida


UMA PALAVRINHA SOBRE OS ESCREVINHADORES DE POEMAS RÁPIDOS E MODERNOS

(Charles Bukowski)




é muito fácil parecer moderno
enquanto se é na realidade o maior idiota
                                             jamais nascido,
eu sei: eu joguei fora um material horrível
mas não tão horrível quanto o que eu leio noas revistas;
eu tenho uma honestidade interior nascida das putas e 
          hospitais
que não me deixará fingir que sou
uma coisa que não sou -
o que seria um duplo fracasso: um fracasso de uma pessoa 
na poesia
e o fracasso de uma pessoa
na vida.
e quando você falha na poesia
você erra a vida,
e quando você falha na vida
você nunca nasceu
não importa o que digam as estatísticas
nem qual o nome que a sua mãe lhe deu.

as arquibancadas estão cheias de mortos
aclamando um vencedor
esperando um número que os carregue de volta
para a vida,
mas não é tão fácil assim - 
tal como no poema
se você está morto
você podia também ser enterrado
e jogar fora a máquina de escrever
e parar de se enganar com
poemas     cavalos     mulheres     a vida:
você está entulhando
a saída -
portanto saia logo
e desista das
poucas preciosas
páginas.

O poeta mandando álcool para dentro
no intervalo do programa

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Um homem estranho perto do Golfo

Badr Shakir al-Sayyab (Iraque)

O simum* sopra seu calor do meio-dia até o final da tarde.
O vento quente sopra abruptamente e deixa as velas ora dobradas, ora estendidas.
O golfo está superlotado com marinheiros labutando.
Eles vagueiam através do mar para ganhar seu pão de cada dia.
Qualquer um deles está com os pés descalços e metade de seu corpo  nu.
Ao longo das areias da costa, o estranho homem está sentado.
Ampliando sua visão, ele olha para o golfo confuso.
O golfo rugoso espalha as luzes, tanto quanto aumenta-se em convulsão.
Uma vez eu o vi tempestuoso e suas ondas levantando espumas violentamente.
Como se um efeito explosivo estourasse em minha alma, relembro-me de meu país.
É como se a maré, como se as nuvens pesadas, como se as lágrimas banhassem os olhos.
O vento sopra rajadas em minha direção:  Iraque. Iraque. Iraque. Ele grita em voz alta.
As ondas choram para mim, Iraque. 
Nunca existirá um país para você, exceto o Iraque.
No entanto, as ondas são extensas; o Iraque está longe de alcançar.
O mar permanece como barreira além de você, meu país.
Ontem, quando visitei o café, eu te ouvi, Iraque.
Pensei que aparentemente você, país, fosse um mero disco a rodar.
Como se as órbitas estivessem rolando onde eu parasse, mesmo que o tempo mudasse seu caminho.

Lembro-me de dois momentos de paz, mesmo que se mudem para outro lugar.
São os momentos vendo a face de minha mãe na escuridão.
E sua voz imaginada em meus olhos quando eu estava quase dormindo.
Além disso, temo os pomares de tamareiras quando fica escuro ao pôr do sol.
Prevejo os fantasmas se aglomerando para  sequestrarcada criança ainda brincando nas ruas.
No entanto, eu não sei como o túmulo foi aberto para lá deixar uma bela mulher!
Então eu a escolhi para ser a única querida amada.

Você não se lembra Zahra? Eu gostaria de saber!
Fomossentar juntos muito perto da lareira um dia?
Fomos sentar com as pessoas circulando a lareira lotada ou nas proximidades, enquanto minha tia contava-nos as histórias sobre reis do passado.
A porta estava fechada firmemente para as palavras das mulheres, mas para ela não.
Uma vez que ela era o suporte para os homens, eles a obedeciam, enquanto os homens ainda conversam em folia sem se cansar naquela noite.
Você se lembra? Você esqueceu?
Você se lembra quando nós estávamos muito satisfeitos com nossas vidas?

Estávamos emocionados ao ouvir a história, pois foi contada por uma mulher.
A história falava de muitos animais assustados em diversos momentos.
Teríamos temperamento vigoroso para ser um dos símbolos de tempos passados?
Achávamos ser parte indivisível do legado do passado?
É tudo em vão?
As únicas coisas que permanecem é sonho e o disco a rodar.
São as coisas remanescentes as únicas recordações?
Onde está o consolo? Para a minha alma, para a minha satisfação, eu poderia pensar!
Seu amor me faz amar ainda mais o Iraque.
Ambos são a mesma coisa, a vela que ilumina o meu caminho.
Lembro-me de você, tanto quando a noite desce e se sobrepõe em camadas.
A noite cobre o local e só você pode iluminar a escuridão para que eu não vagueie nessa profundidade.
Se você vem para me encontrar no país estranho, o que eu tenho a dizer?
O encontro preferido para mim é na terra do meu país, que eu amo.
A saudade da minha terra suscita em mim que viaje algum dia.
Meu desejo do meu país evoca no meu sangue, a minha fome, ainda, minhas emoções.
Eu desejo meu país como o afogado insistindo pelo ar.
Eu desejo meu país como o feto anseia ver a luz.
Fico espantado em pensar como alguém pode trair o seu país.
Será que realmente alguém pode trair o seu país!
Se ele trai, como ele pode tocar o solo, o ar, ou como ele pode beber sua água?
O sol no meu país, mesmo no escuro é o mais belo de todos os lugares.
Sinto a escuridão quando ela me cobre, meu país seria um lugar seguro.
O Iraque dormiria em paz.

Ai de mim! Que pena! Como e quando posso dormir?
Então posso sentir no meu travesseiro o odor de noites de verão do Iraque.

Quantas vezes eu cantei com alegria entre seus vilarejos acolhedores das cidades ocidentais?
Eu carrego seu sonho como o cristão que é expelido conduzindo sua cruz.
Eu ouvi as vozes das pisadas dos homens famintos e estavam sangrando por causa de tropeço.
Vai espalhar em meus olhos a poeira do Iraque, que impulsiona a emoção.

No entanto, ainda estou caminhando com os pés descalços sobre o chão estranho sob o sol impiedoso de países estrangeiros.
Vestindo roupas esfarrapadas, estendi minhas mãos orvalhadas para as pessoas.
Desdém, desprezo, entre os olhos descuidados eu vago suas ruas.
A morte é cem vezes melhor para mim do que dizer: Oh, pobre homem!

Na verdade, é melhor do que amáveis olhos caridosos quase que a contragosto.
Eu desprezo os tostões sem valor a colocar na minha mão e na minha alma.

Se somente! Você, sangue, cessar e não possa fluir em minhas veias.
Se somente! Você dinheiro desaparecer e se transformar em meras coisas fúteis.
Se somente! Vocês, gotas metálicas voarem e evaporarem no céu.
Oh, agulha! Quando você vai terminar a costura das velas?
Oh, o vento! Quando você será capaz de levar embora a vela?
Então eu poderei retornar ao Iraque. Se só fosse isso! Eu poderia retornar ao Iraque.

É agora? Eu gostaria de saber! É agora.
Oh! As ondas brilhantes foram mexidas pelo remo silencioso.
Se eu tivesse dinheiro! Agora eu estaria no meio do golfo, embaixo das suas grandes estrelas brilhando, indo para casa.
Se apenas! Os navios não ganhassem dinheiro com os viajantes.
Se apenas! A terra fosse expandida e não fisesse fronteira com mares.

Ainda em vão! Conto meu dinheiro, desejando que ele fosse mais.
Ainda, sou desprezado por causa do dinheiro que sofre as dores de emigração.
No entanto, com a alma ansiosa senti teu brilho na minha porta e janela.
Oh! Dinheiro, pode me dizer, em outro banco, qual é o seu segredo!

Você pode me dizer quando eu voltar para casa? Somente isso! Você pode me dizer.
Está o feliz dia desenhando-se ante que eu morra?
Ressuscitarei naquela manhã promissora quando o céu estiver nublado.

Quando vejo estar um pouco de brisa fria saturada com o perfume do outono…
E eu poderia desviar-me do resto da minha sonolência.
O cansaço, que é semelhante ao véu transparente, está contra meu olho.
Como a capa de seda revela o visível e o invisível por debaixo.
O véu, se eu remover, vai revelar o que é esquecido e o que é duvidoso.
Então eu posso encontrar o novo traje que tenho procurado por sobre e junto à minha alma sombria.
Por um longo tempo eu não vi a alegria, e considero-a como denso nevoeiro.

Hoje a alegria enche meu coração de repente. Eu voltarei, posso ter certeza?
Ai de mim! Eu não tenho dinheiro suficiente para voltar para casa.
Será que alguém que tenha dinheiro insuficiente pode viajar ou voltar para casa?
Como é que o dinheiro pode ser economizado? Eu não sei! Mas eu não sei!
Como pode o pobre homem guardar o dinheiro se ele não pode encontrar algo para comer?
Como pode o pobre homem guardar o dinheiro se ele vive nas instituições de caridade?

Vocês olhos, vocês devem derramar lágrimas amargamente sobre o Iraque.
Oh! Alma você deve chorar amargamente sobre o Iraque.
Você tem apenas as lágrimas para doar.
Você não tem escolha, apenas a espera.

Em vão, você espera a misericórdia do vento e das velas a se ajustarem um dia.



Traduzido para o inglês: Mohammad Mahmud Ahmad
Versão em português: Álvaro Nassaralla
 
 
* Simun - Do árabe 'Vento venenoso' - Wikipedia

Simum é um vento forte, seco, carregado de pó local que sopra no deserto do Saara, Jordânia, Síria e os desertos da Península Arábica. A sua temperatura pode ser superior a 54 ° C (129 ° F) e a umidade pode cair abaixo de 10%.

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Os anéis azuis do pensamento

Belíssimo poema do poeta amigo Edu Planchêz, extraindo a essência da marginalidade artística, por nada dever ao sistema.


O poeta Edu Planchêz no Sarau Corujão da Poesia
Livraria Saraiva -Baixo Leblon - RJ/2015


OS ANÉIS AZUIS DO PENSAMENTO 
Edu Planchêz


A minha sede de Bhuda se casa com a tua fome,
com a caravana encarnada,
mulher que não me ama ( que me ama ),
mãe que me chama,
que não me chama de filho,
xereca que morde,
que não me morde por ( medo ? )
( por amor adicional de artista extremo? )

Um beijo do tamanho do chão nos seios
da apresentadora do jornal da noite,
Artaud e Diego El Khouri vestidos
de porra nenhuma,
eles tramam burlar bolinar...
ver o lago de antigamente
se elevar nas chamas
do templo da fertilidade
de nossa loucura lisérgica

E os olhos da grande caverna,
e os olhos da veia cava,
das teias do feto que se move nos sonhos
da mãe de Apollinare

Nas alturas das esculturas formas tuas, mãe,
fêmea Tarsila, filha minha, filha da forma,
do grude que nos ata um ao outro

Camille Claudel,sempre fui teu namorado,
teu favo de tinta, tua espátula,
os anéis azuis do pensamento



Blog do poeta: Lábios cariocas