domingo, 24 de fevereiro de 2019

Jornal Literário Rascunho e dois tapinhas na cara



O Jornal Relevo traz na edição de Fevereiro dois "'tapinhas na cara". Os poemas do russo Boris Pasternak e da brasileira Diana Joucovski podem ser considerados "pílulas ego-dispensadores".

Seguem as "crianças":

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Ser famoso nada tem de bonito, 
Nem levanta ninguém até as alturas. 
Não é preciso vasculhar arquivos, 
Abasbacar-se sobre manuscritos.

Dar-se é a finalidade da criação, 
Não o sucesso ou o sensacionalismo. 
É vergonhoso, além de sem sentido, 
Ser na boca de todos — falação.

É bom viver sem enaltecimento, 
Viver de um jeito, no final das contas, 
A atrair a si o amor do firmamento, 
E ouvir, isso sim, as vozes do porvir.

É bom deixar lacunas no destino 
E não por entre as folhas de papel, 
E assinalar o título e as passagens 
Da vida inteira, em notas sobre as margens.

Deve-se mergulhar no anonimato, 
E tratar de esconder o seu caminho, 
Como se esconde a vila na neblina, 
Quando sequer se enxerga o seu nariz.

Outros irão por sua pegada viva 
Seguir o rumo que você deixou, 
Mas você mesmo não diferencie 
Da derrota, a vitória a que chegou.

E não deve nem em pequena parte 
Renunciar a seu rosto, tal e qual, 
Mas procurar ser vivo, vivo, só 
Vivo e somente vivo até o final. 

Boris Pasternak
<1956>

in: Jornal Relevo
fev-2019




perdão samanta sch
Diana Joucovski

maldição é não ser capaz de amar o texto alheio se for muito mais do que ameno. quero dizer, se é insosso passa reto, se desastroso segura o ego e se surpreende dá uma coceirinha de inveja no cérebro. ah mas a gente aprende... e quem sou eu pra dizer que não? e mais, por que é que vou dizer que não é assim que sou? pois se invejo a frase que eu teria escrito se fosse mais esperta, mas infelizmente continuo sendo eu quando fecho o livro cujos contos começaram, seguiram e terminaram com os finais ou enredos que eu os teria dado. publicados. alguma espécie de déjà vu criativo: só sei que escreveria daquela forma quando termino a coisa. quando é minha vez, a bagaça da minha autoria vai de agradável a abominável como o fim desse texticulo. nunca poderia amar sem odiar simultaneamente um escritor sendo seu semelhante, é disso que sei — digo de boca cheia, mas com o mesmo pesar que se dissesse que odeio meus pais: ana c plath Clarice & woolf, entre outras mulheres. dessa vez de uma desconhecida: a tal da samanta schalguma coisa — já ouviram falar? se não Na Estepe é o que me fez lançar o livro à parede de ódio e prazer. samanta bonita que só ela na orelha detrás — pra quem não sabe: a contracapa dobradinha. em preto e branco também, quando todo mundo fica elegante. ai samanta comprei seu livro justamente pela razão que me faria detestá-lo e agora vivemos um relacionamento abusivo. mas oh, um final subjetivo daqueles! essa foi uma crítica desengonçada com palavrões entrelinhas? (sou uma pessoa crítica, não crítica com c maiúsculo, e por causa dessa revolta sou menos ainda escritora) no entanto se pensarmos bem pode ser que você importe só agora, como a maioria das coisas — é que hoje, como não tem outro dia senão esse, sua mão preta e branca argentina marcou minha cara com um belo de um tapa.



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